FÁBULA
DE NATAL
Era época natalina e os cidadãos de Caiçara,
no norte de Goiás, estavam enfeitando suas casas e fazendo
suas compras para a grande data mundial do cristianismo. As
casas já estavam decoradas com belas árvores de
natal cercadas de pacotes e as crianças eufóricas
com a preparação da festa e a chegada dos presentes.
Na principal avenida da cidade ficava a casa do Dr. Marcondes,
a mais bonita e a que mais se destacava nessa época,
com sua graciosa decoração que incluía
uma pequena fonte luminosa e milhares de lâmpadas coloridas.
O morador solitário dessa mansão era um médico
aposentado que ficara muito rico e que perdera sua esposa e
seu único filho em um acidente.
Para o Dr. Marcondes o dia de Natal era idêntico aos demais,
não gostava de comemorar nada sozinho e apenas enfeitava
a casa por orgulho, para que nenhuma outra casa da cidade pudesse
superar a sua. Nessas oportunidades ele jantava cedo e ia dormir
ignorando as celebrações do mundo cristão.
Uma noite, quando, distraído, voltava do cinema para
sua casa, o Dr. Marcondes foi atropelado por um veículo
dirigido por uma pessoa alcoolizada, que fugiu sem prestar socorro
à vítima. Depois de passar longos minutos caído
ensangüentado, ele foi encontrado por um menino de rua,
que o socorreu, levando-o com muita dificuldade para o hospital.
Segundo o médico de plantão, bastaria ter passado
mais um minuto e sua vida não poderia ter sido salva.
Quando o Dr. Marcondes teve alta e voltou para casa, várias
pessoas o procuraram pedindo a ele que ajudasse o menino que
o salvou, que o tirasse das ruas e o matriculasse em uma escola,
mas o velho médico era teimoso e dizia que nunca ninguém
o ajudou, porque ele ajudaria esse menino? Já havia dado,
a título de recompensa, uma pequena quantia a seu pai,
que infelizmente a gastou com bebidas, não ia dar mais
nada.
Duas semanas depois o menino faleceu de inanição
e desidratação profundas. Naquela noite o Dr.
Marcondes foi dormir sem sentir qualquer tristeza ou remorso,
era apenas mais uma noite solitária na mansão.
De repente uma luz intensa surgiu na parede em frente a ele
quase cegando-o, nessa luz surgiu o rosto do menino que o salvou
e lentamente a imagem foi se transformando no rosto de seu único
e saudoso filho.
O velho médico ficou enlouquecido, acabara de perceber
que aquele menino de rua era a reencarnação de
seu filho querido, que estava ali tão próximo
dele e ele não o socorrera. Decidido a se matar, pegou
a arma na gaveta da cômoda e apontou para sua cabeça,
mas percebeu que a imagem de seu filho projetada na parede agora chorava. Ele não poderia se matar, era véspera
de Natal e ele precisava fazer algo para acalmar seu coração
atormentado.
No dia seguinte chamou à sua casa a responsável
pelo orfanato da cidade, e pediu a ela que trouxesse todas as
crianças para passar o Natal com ele. O velho médico
comprou roupas e brinquedos, mandou que preparassem a maior
ceia natalina já vista em Caiçara e comemorou
o Natal com os órfãos, que encheram aquela mansão
de alegria.
O verdadeiro Milagre de Natal aconteceu no dia seguinte, o Dr.
Marcondes confessou a todos que nunca fora tão feliz
em sua vida e que os órfãos jamais sairiam de
sua casa, ele iria adotar a todos e dar a cada um deles o melhor
que a vida lhes poderia oferecer.
Lupércio Mundim
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