TIÃO RELÂMPAGO


A tempestade atingiu aquela cidade com toda sua fúria, como nunca antes acontecera. A chuva forte lavava suas ruas, os raios cortavam o céu e árvores centenárias tombavam sob a violência dos ventos. No meio desse cenário assustador um homem caminhava calmamente, como se estivesse passeando em um parque.

Tião Relâmpago não temia as tempestades, muito pelo contrário, adorava caminhar pelas ruas quando todos se recolhiam receiosos. Mas essa história começa muitos anos antes, quando ele era apenas um garoto órfão que havia sido "adotado" pelos funcionários da prefeitura, onde lhe reservaram um cômodo que lhe servia de residência.

Tião levava uma vida normal, durante o dia era office-boy da prefeitura e à noite estudava no Ginásio Municipal. Ele estava atrasado nos estudos porque seu raciocínio era mais lento que os dos outros garotos e porque sua vida apenas regularizou-se depois que foi adotado pelos trabalhadores municipais, que lhe conseguiram moradia, trabalho e estudo. Ele agora não era mais menino de rua, poderia ter um futuro.

Um dia uma tempestade abateu-se sobre o município, causando grandes prejuízos. A cidade estava deserta, pois seus habitantes recolheram-se diante daquela ameaça da natureza. Tião dormia em seu quarto na prefeitura quando um raio caiu sobre o velho prédio, desprovido de pára-raios, atingindo-o parcialmente.

Logo após ouvir o estrondo, algumas pessoas correram até a prefeitura para ver o que havia acontecido e encontraram o rapaz desacordado no chão, todo chamuscado. Levaram-no correndo para o hospital, onde recebeu atendimento de emergência.

Aparentemente, além de algumas queimaduras sem gravidade, Tião não havia sofrido nenhum outro ferimento, mas algo definitivamente havia mudado. Quando ele retornou à sua rotina de trabalho e estudo, todos perceberam que ele estava muito mais esperto e inteligente.

Seu raciocínio agora era o mais rápido da turma, assim ele completou seus estudos, formou-se em Filosofia, conseguiu algumas promoções e agora já era chefe de gabinete do prefeito. Apesar de permanecer solteiro por opção própria, era um homem sério e respeitado por todos.

As pessoas só duvidavam de sua sanidade em dias como aquele, em que saía a caminhar no meio da tempestade. Alguns chegavam a pensar que se aquele raio por um lado melhorou seu raciocício, por outro o desequilibrou mentalmente. Mas Tião não ligava para esses comentários, andava em meio à tempestade como que a agradecê-la pelo que recebeu.

Tião não sabia, mas a mesma mão que lhe traz um benefício, às vezes, lhe toma outro, é a lei da compensação. Naquele dia a tempestade estava ali para lhe cobrar a sua parte, para levar a sua vida. Caminhando sob a chuva forte, completamente encharcado e tendo o corpo tocado pelo sopro forte do vento, ele sentia-se tão bem que deixava escapar um sorriso sorrateiro nos lábios. Foi quando um raio atingiu a rua, matando-o instantaneamente. No seu velório todos diziam que ele morrera feliz, pois estava sorrindo...


Lupércio Mundim


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