AS FÉRIAS


Durante as férias minha família sempre ia a Ipameri, onde encontrávamos nossos entes queridos e nossos velhos amigos. Era ótimo porque tínhamos uma liberdade que nunca teríamos no Rio naquela época. Algumas vezes levei o meu amigo 46 (Amado) nessas viagens. Naquele tempo não se ia do Rio a Ipameri em menos de dois dias.

Pegávamos um ônibus de madrugada no Rio e descíamos em São Paulo e tomávamos outro para Ribeirão Preto, onde geralmente passávamos a noite. No dia seguinte tomávamos outro ônibus para Uberlândia, de lá a Araguari e de lá, finalmente, para Ipameri, aonde chegávamos ao anoitecer. Era uma senhora jornada, mas a diversão também era enorme.

Numa noite em Ribeirão Preto resolvemos não ir para o hotel e ficar na praça, éramos jovens, tínhamos saúde e a grana era curtíssima. Foi engraçado porque o Amado se comportou como se estivesse no hotel, abriu a mala, trocou de roupa, arrumou o banco da praça e se deitou. De madrugada percebemos que tudo estava fechado na cidade, menos a nossa fome.

Saímos em busca de algum bar aberto e de repente vimos luzes acesas em uma padaria, nos aproximamos e percebemos, pelo movimento, que ela abriria as portas a qualquer momento. Então ficamos em pé bem rente à porta, congelados pelo frio da madrugada de Ribeirão Preto. Quando o dono da padaria puxou a porta de aço e deu de cara com nós dois, congelados, com fome e com os olhos esbugalhados pelo cansaço da viagem, quase morreu de susto.

Quando reanimamos e acalmamos o dono da padaria, explicando porque estávamos ali naquelas condições, ele riu muito, disse que quando era jovem também passara por aquilo e nos deu tantos pães quanto desejássemos. Foi muito bom, matamos a fome e a sede, porque depois tivemos que beber cinco litros de água para desembuchar.

Certa vez resolvemos fazer uma viagem com todo o alto comando do internato. Planejamos uma ida a Cabo Frio, mas devido à falta de fundos teríamos que pegar carona. Em um sábado bem cedo nos encontramos na Praça 15, tomamos uma barca para Niterói e, de lá, um ônibus até a rodovia para Cabo Frio. Esta foi a parte fácil desta estória.

A ordem era nos separarmos em grupos de dois e "ir andando" enquanto não aparecia a carona. Este "ir andando" quase nos levou a Cabo Frio. Finalmente apareceu uma Kombi com um padre que revelou só ter nos dado carona por ter visto o nome do colégio em nossas camisetas (pensando ser do Colégio São José do Rio de Janeiro, de padres). Mentimos com a cara mais limpa que conseguimos, pois não agüentávamos mais caminhar.

Num acampamento de sete homens apareceu uma mulher, como todos tentamos cantá-la sem sucesso decidimos sorteá-la ao cair da noite. Havia duas barracas, em uma ficariam seis homens miseráveis e em outra uma mulher e um felizardo. Terminado o sorteio fomos para as barracas. Ficamos com os olhos e ouvidos atentos ao que acontecia na outra, mas nada!

No dia seguinte veio a explicação: A moça chorou, contou sua vida todinha e depois eles decidiram dormir, sendo que ela acordou cedinho e foi embora. O tal felizardo teve que voltar correndo para o Rio, para escapar de nossa fúria.

Outro fato engraçado desta viagem foi que um colega nosso apelidado Maguila resolveu dormir a última noite fora da barraca, porque lá estava muito apertado (imagine o tamanzinho dele). Na manhã seguinte nos levantamos, reunimos nossas coisas, desmontamos as barracas e, na hora de partir, sentimos falta do Maguila. Cadê o Maguila? Ele havia se enterrado na areia por causa do frio da madrugada e quase que não o encontramos. Como dormia o desgraçado.

Lupércio Mundim

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